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CONSIDERAÇÕES SOBRE O PROGRESSO TECNOLÓGICO E A ARQUEOLOGIA CULTURAL NA EUROPA                                                                                         DO SÉCULO XIX                                                                                           

No século XIX a sociedade europeia se depara com o inadiável progresso tecnológico e com os seus efeitos decorrentes. Surge a partir daí, um crescente sentimento nacionalista de algumas nações da Europa mais dominantes e desenvolvidas culturalmente. A arqueologia nesse período assume papel preponderante.

Com a revolução industrial, amplia-se consideravelmente as competições econômicas estrangeiras, resultando em estágios de insatisfações e vigorosas discussões além de conflitos sociais.

As nossas relações humanas do presente refletem uma distância e grandes incertezas em relação à ética, à arte, à antropologia, à sociologia e à arqueologia, levando o homem para um caminho cada vez mais distante das relações com a natureza.

Palavras-chave : Progresso tecnológico; Etnicidade ; Arqueologia; Arqueologia Cultural.

Introdução

 

Este artigo surge como reflexão do progresso tecnológico e suas consequências experimentadas pela sociedade europeia, através da Revolução Industrial que imprimiu ao Continente um ritmo de vida e de

sociabilidade jamais vivenciado, além da concorrência de mercados entre as nações por todo o século XIX. Aborda também a questão do difusionismo cultural francês e o desenvolvimento da arqueologia cultural na Europa a partir do século XIX.

A Arqueologia Histórica irradia-se por toda a Europa Central na busca de novas informações sobre os relacionamentos humanos e sua produção cultural, agregando valores e incentivando a abertura de Museus e Institutos de Cultura ampliando, consideravelmente, o interesse da sociedade pelas manifestações culturais deste século.

Se por um lado a Revolução Industrial foi símbolo de desenvolvimento e de progresso para a sociedade, por outro provocou inúmeras reações de movimentos trabalhistas que surgiram e marcaram àquela época.

Cultua-se o Difusionismo, aprofunda-se as discussões sobre etnicidade e cultura arqueológica, e o homem em sua liberdade cultural.

O ideal histórico de progresso que acentua o processo industrial na produção de bens necessários revela, por outro lado, nas áreas marginais desta produção industrial, vasculhadas pela pobreza e conflitos sociais, consequências degradantes. E esta perspectiva, por certo, nos confere uma relação sombria entre o homem e a natureza.

Considerações sobre o progresso tecnológico e a Arqueologia Cultural na Europa no século XIX.

No decorrer do século XIX a sociedade europeia – mesmo diante de todo o progresso tecnológico que lhe era oferecido – acenava para algumas discussões que preconizavam os efeitos devastadores que revestiam este

progresso. Contudo, com o aumento da produção industrial entre as nações europeias e a crescente concorrência entre os mercados receptores verificou-se, espontânea e continuamente, um crescente nacionalismo na Inglaterra e notadamente na França, que procurava ampliar a sua influência histórica e cultural no velho mundo.

Comenta Trigger2 que, “na Europa Central e do Norte, a Arqueologia esteve associada ao nacionalismo durante todo o século XIX”. Ainda neste século, desempenhou um importante papel na unificação da Alemanha, desencadeando um senso de identidade étnica prolongado por muito tempo, ajudando a exprimir o orgulho do povo alemão por suas realizações.

 

Na segunda metade do século XIX, amplia-se consideravelmente o número de lugares escavados por toda a Europa Central. Primeiro, em busca de nova documentação – artefatos líticos, ruínas de edificações da antiguidade ou outros materiais arqueológicos diversos; depois, em nome da inovação urbana, através da construção de estradas, ferrovias, aeroportos. Decorrente dessas escavações, um crescente número de Museus e de Institutos de Cultura foram abertos e, cada vez mais, pesquisas arqueológicas foram rea-lizadas, ampliando-se, desta forma, o interesse da sociedade por estudos diversos.

 

As ideias que se ampliam com o desenvolvimento da revolução industrial e suas influências prazerosas experimentadas pela sociedade evolucionista desse século (XIX) criaram, por outro lado, inúmeros problemas econômicos e sociais, sobretudo na Europa Central, retratando um quadro de crescentes competições estrangeiras e levando esta sociedade a insatisfações e aos primeiros movimentos trabalhistas, como nos revela Hobbsbawn. Em consequência desses acontecimentos, inúmeros intelectuais dessa época rebelaram-se contra o desenvolvimento industrial e os danos por ele causados.

O que antes era considerado pela sociedade como um fator de crescimento e de progresso, irrompe, então, como um estágio de desilusão diante da criatividade humana.

 

Muitos arqueólogos europeus do século XIX que haviam experimentado o nacionalismo – estimulados pelos intelectuais dessa época – se encontraram de braços dados com o Difusionismo, admiravelmente propagado pelo antropólogo britânico Elliot Smith (1871-1937), que defendia a teoria de que “todo o desenvolvimento cultural da Antiguidade tinha ocorrido no Egito”. Logo depois, no inicio do século XX, diante da evolução da arqueologia com inovadoras técnicas de identificação e de datação dos registros arqueológicos, foram reveladas decisivas respostas em relação às culturas da Antiguidade. Nesse sentido, os arqueólogos de então estiveram divididos entre os modos de pensar evolucionista e difusionista, quando estes eram “mais otimistas quanto à capacidade de mudanças da sociedade humana”3.

 

O aprofundamento das discussões sobre etnicidade contribuiu no final do século XIX para a criação e formação do conceito de cultura arqueológica, dando um caráter cultural, portanto, aos estudos sobre a pré-história. Inúmeros foram os etnólogos que escreveram sobre o tema, dentre eles o alemão Gustav Klemm (1802-1867), autor do clássico “História Cultural Geral da Humanidade” (1843-1852) e o etnológico inglês E. B. Tylor, que abordou o tema no seu trabalho “Primitiva Cultural” (1871), trazendo um clássico conceito de cultura como sendo “um conjunto complexo que inclui conhecimento, crença, arte, moral, leis, costumes e outras capacidades e hábitos adquiridos pelo homem como membro de uma sociedade”, demonstrando com estas palavras que maneiras de vida são transmitidas por determinados povos, de geração em geração, lembrando a etnicidade difusionista e o grande interesse da Europa Central em relacionar identidades étnicas através do registro arqueológico. Não obstante, a utilização do termo cultura – empregado por intelectuais e

arqueólogos no final do século XIX e inicio do século XX – designava, além de sucessivas ocupações em um sítio, o desenrolar de uma civilização.

 

Com o desenvolvimento tecnológico e científico revelado a partir da nova concepção filosófica da ciência moderna, procurou-se decifrar o homem a partir das suas relações culturais (incipientes). Com isso, os esforços para se transmitir tal conhecimento, está no desenvolvimento e na oferta de técnicas “produzidas” pela natureza levando aquele homem a produzir uma expressão em sua criatividade e, consequentemente, em sua liberdade cultural.

 

Baseado nessa condição pode-se revelar que o conhecimento tecnológico e cientifico de hoje corresponde ao processo de criação e de produção humana de tempos mais distantes, experimentado pelos homens de outrora em suas relações sociais vigentes naquele período. Na Grécia Antiga, por exemplo, na filosofia platônica, a noção de poiésis tanto significava o processo de criação, quanto o processo de produção artesanal das coisas e, também, o ideal da arte. Em Vitrúvio – arquiteto e admirável teórico romano da história das ideias e da estética – encontra-se uma definição artesanal e poética da arte, inclusive da própria arquitetura, considerada por ele como “a síntese de todas as artes e tarefas civilizatórias”, como nos revela Eduardo Subirats, em “A Cultura como Espetáculo”,(E. Subirats,1990.p.36). Para Jacques Maritain, “a arte reside na alma e é desta uma certa perfeição”. Tanto a arte quanto a produção técnica e o conhecimento científico das leis do Universo, como relembrava Vitrúvio, estariam intimamente atreladas a um princípio uno de beleza.

 

Durante o período medieval, ou eram tratadas as capacidades técnicas e os conhecimentos materiais como estreitos laços acerca da espontaneidade inventiva, ou o toque original do processo subjetivo da criação fazia ressaltar esse intercâmbio de significados entre a criação e/ou o realizar poético, e até a produção técnica das novas práticas da estética do funcionalismo. Por outro lado, essa dualidade de pensamento – do lúdico e da produção tecnológica – é analisada em novos termos pela filosofia científica de Francis Bacon, o qual

admite o conhecimento como, “um gesto advindo da liberdade, da crítica e da capacidade do homem”. Afirmava Bacon que, “o conhecimento científico era a grande esperança para a humanidade”. Contudo, lembra Eduardo Subirats que, “ambas as dimensões da produção técnica e do conhecimento – a libertação humana de sua indigência física, de seu estado econômico de escassez e inclusive das desigualdades e conflitos sociais derivados em parte dessa condição; e, em segundo lugar ou ao mesmo tempo, a realização humana como poder e liberdade como sujeito dominador da história e do universo – tornaram-se irrelevantes na cultura contemporânea”.

 

O ideal histórico de progresso revela em nosso tempo algumas divergências textuais, como as formas de políticas mais efetivas que encarnam a crise no seio do próprio processo industrial ao atingir o clímax de sua produção de bens necessários, gerando, assim, nas áreas marginais desta produção industrial, visivelmente vasculhadas pela pobreza, pela abrupta violência social, pela degradação ambiental e conflitos sociais, consequências humanamente degradantes e insolúveis. Conquistamos, certamente, um de-senvolvimento tecnológico contemporâneo maculado pelo conceito social de progresso, a exemplo das ideias sociais dos positivistas e dos socialistas do século XIX, quando defendiam algumas vertentes econômicas e políticas baseadas em uma competitividade social que objetivava um histórico universal.

 

Na verdade, admitimos de certa forma que as precárias condições de sobrevivência de populações menos afortunadas – restos sociais das metrópoles industriais diretamente afetadas pelos distúrbios de colonialismo, bem como também pela espoliação selvagem – sofreram com a incidência dos fenômenos que desequilibram a natureza retratada nesse contexto, pela perspectiva de uma angústia histórica devido a uma relação sombria entre o homem e a natureza.

 

O nosso momento histórico contemporâneo parece refletir uma fissura que se amplia a cada dia sobre os nossos conceitos e certezas em relação à arte e à ética, as nossas relações sociais e econômicas, à antropologia e à

arqueologia, enfim, sobre as ciências que estudam o homem e sua relação com o mundo e a natureza. O ilimitado poderio tecnológico do homem contemporâneo subtraiu-lhe aquela vivência mágica de ontem, a romântica alquimia de construir o seu caminho, bem como a descoberta da feliz condição hegemônica do homem sobre a natureza. E nessas explícitas mudanças cientí-ficas, o progresso ganha um revestimento metálico refletido das novas máquinas – rápidas e inteligentes – conduzindo a nossa sociedade a um universo tecnocientífico industrial.

Referências Bibliográficas.

1. Subirats, Eduardo. A Cultura como Espetáculo. São Paulo: Nobel, 1989.

2. Trigger, Bruce g. História do Pensamento Arqueológico. São Paulo: Odysseus,2004.

3. Oosterbeek, Luiz. Arqueologia, Patrimônio e Gestão do Território: Polêmicas Erechim,RS: Habilis, 2007.

4. Brostin J. Daniel. Os criadores. Uma História da Criatividade Humana. Rio de Janeiro,1995.

 

5. Wolfflin, Heinrich. A Arte Clássica. Tradução de Marion Fleischer. São Paulo: Martins Fontes, 1990. (Coleção A).

Edit by CarlosDantas

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